Eu andava pelas ruas da
minha cidade, era um dia normal, crianças correndo pela rua, pré-adolescentes
de namoricos nas calçadas, jovens ouvindo musicas e os adultos ocupados. Eu
passava em frente uma loja, a T&T. Lá vendia de tudo: eletrônicos,
brinquedos, eletrodomésticos e etc. Eu costumava passar todos os dias em frente
dela, a caminho do colégio, e nesse dia tinha um celular na vitrine, mas não
era só um celular, era “O” celular. Sua câmera com alta resolução, memória
enorme, seu design perfeito, e ainda por cima cinza, minha cor preferida.
Nossa! Eu precisava ter ele.
Todo mundo vive dizendo que sou compulsivo em
compras, e que a cada lançamento de qualquer produto, eu queria tê-lo e que pra
mim, aquilo só era bom até lançarem um novo modelo. Na época eu me revoltava
com isso, mas hoje percebo quão fútil eu era.
Continuando: ao ver o celular, já
sabia o que pedir para meus pais. Passei à tarde no colégio, quase não me
aguentando de ansiedade, chegando a minha casa joguei minha mochila no sofá e
fui falar com minha mãe na cozinha:
- Mãe! - gritei
entrando na cozinha.
- O que foi Askhar? -
perguntou minha mãe, que lavava louça e nem se quer olhou para trás.
Ela é bem
parecida comigo, sua pele também é pálida seus cabelos iguais aos meus. Não vou
entrar em muitos detalhes, pois fazer a descrição de meus familiares é bem
doloroso para mim, e logo vocês saberão por quê.
- Mãe, eu vi o celular
dos meus sonhos, por favor, compra pra mim? - Ela virou para trás e revirou os olhos, pois já havia presenciado essa cena milhares de vezes.
- Não Askhar! Você me
disse isso no mês passado e eu comprei para você, não se passou nem um mês
direito e você já quer outro? De maneira nenhuma! Além do mais, o aniversário
do seu irmão é daqui dois dias e eu e seu pai iremos comprar um presente para
ele.
Eu peguei meu celular,
o modelo que antes me era atrativo, agora me parecia lixo, joguei-o no chão e
disse exaltado e irritado:
- Também eu não quero
essa porcaria! E eu espero que meu irmão odeie o presente que vocês vão dar a
ele! Eu vou sair e não precisa me esperar!
Nisso sai de casa
pisando duro no chão rumo a não sei aonde.
Já anoitecia e eu
vagava pelas ruas da cidade, pensei em dar um tempo na casa de amigos, porém eu
não tinha amigos, continuei vagando pelas ruas, envolto nos meus pensamentos,
não prestava atenção aonde ia, até resolver parar.
Eu estava numa parte da
cidade que eu não conhecia muito bem, já havia estado ali apenas dentro do
carro, a rua estava deserta, mas bem iluminada, a casas estavam todas com portas
fechadas e luzes acesas. Uma casa em especial chamou minha atenção. Ela era do
tipo de casa antiga, que sempre há em qualquer cidade, e é considerado um
patrimônio, mas não sei se esse era o caso. A casa tinha dois andares pintada
toda de branco, havia quatro janelas: duas na parte de cima, duas em baixo. Com
traços fortes, a casa tinha um ar rústico, porém elegante, o tipo de casa que
uma família bem conservadora moraria. A casa parecia estar vazia, o que me fez
ter a ideia de passar a noite ali, pois naquele momento, a última coisa que eu
queria era voltar para casa.
Fui em direção a sua
calçada onde subi os cinco degraus que levavam a porta principal que parecia
ser feita de uma madeira resistente, entretanto o tempo a desgastou bastante.
No entanto, quando a abri, ela abriu rangendo.
Dentro da casa era tudo bastante
organizado, tinha várias estantes com livros, que não estavam empoeirados,
moveis antigos, mas em ótimo estado, o chão era coberto por uma madeira, que
rangia sob meus pés. Continuei a vagar por ela, não tinha quartos na parte
debaixo, apenas algumas salas cheias de estantes com livros, o andar de baixo
parecia até uma biblioteca! Mas como não tinha camas, resolvi subir para ver se
achava alguma. Subi a escada, tinha uns dez degraus, toda branca e feita de
madeira, a escadas também rangiam e esse range-range já estava enchendo o saco.
Ao chegar ao topo da
escada vi um corredor pequeno que seguia para a esquerda, em suas laterais
viam-se portas, quatro de um lado, três do outro. Essas portas estavam todas
abertas. Andei pelo corredor, olhando dentro delas e todas estavam vazias, não
tinha mobília, quadros, livros, nada. Exceto uma. Nessa havia uma mesa pequena,
em cima dela uma almofada roxa, e o que mais me impressionou foi o que estava
em cima da mesma: uma lâmpada, mas não qualquer lâmpada, mas sim aquele tipo de
lâmpada que contém gênios que realizam desejos nos contos de fadas.
Ela era toda dourada,
sua alça fazia uma bela curva, e tinha uma corrente que prendia a alça ao topo
dela, seu bico alongado como de um bule, exatamente esse tipo de lâmpada é
descrito nas histórias de gênios mágicos.
Eu sempre fui bem
cético em relação a essa história de acreditar em magia, mas quem de vocês
encontraria uma lâmpada dessa e não esfregaria? Mesmo sabendo que não ia
funcionar, foi o que fiz, esfreguei a lâmpada, e nada aconteceu. Eu podia parar
por aqui e dizer que a lâmpada não era mágica e que voltei para casa. Mas não
foi bem assim que aconteceu.
Ao esfregar a lâmpada,
uma fumaça azul começou a sair dela, achei que meus olhos me enganavam, a
lâmpada brilhava intensamente, a fumaça ficou verticalmente no ar, formando um
“i” da minha altura. A fumaça começa a se dissipar deixando em seu lugar uma
figura, foi nesse momento que conheci o gênio.
Como você imagina um
gênio da lâmpada? Um cara de turbante, da cintura para baixo feito de fumaça? A
partir desse momento apague essa imagem da sua cabeça! Ele era igualzinho a
mim. Tudo! Cabelo, olhos, pele, rosto, era como se fossemos gêmeos idênticos!
Quem melhor para te oferecer seus maiores desejos se não você mesmo? Ele não se
moveu, ficou parado. Trinta segundos de silencio. Ele se move, anda ao meu
redor e apesar de ser um rosto familiar, a sensação não era nada boa. Após dar
a volta completa e parar novamente em minha frente e diz com uma voz amedrontadoramente
igual a minha, aquela famosa frase:
- Vou conceder a você
três desejos. Quais são?
Uau! Eu desejava muita
coisa, queria muita coisa, eu deveria pensar bem antes de escolher, ou, antes
de acordar de algum sonho maluco, eu pensava e pensava, até que uma ideia me
ocorreu, para que me limitar a três desejos, quando posso ter tudo que quero e
quando eu quero? Então já tomado pela ganância disse ao “Eugênio”:
- Só preciso de um
desejo: Quero desejos infinitos!
Ele não reagiu. Não fez
nenhuma expressão. Comecei a achar que, esse pedido era contra as normas ou
alguma coisa do tipo, mas depois ele deu um suspiro, como se eu não fosse a
primeira pessoa a pedir isso, então ele disse:
- Sim, esse desejo pode
ser realizado, mas por ser um pedido digamos... Exigente, ele tem algumas
condições.
Parecia justo, um
desejo desse porte com certeza teria algumas limitações.
Ele desaparece em meio
a uma fumaça azul e reaparece atrás de mim, me viro rapidamente antes mesmo dele
começar a falar:
- Você poderá realizar
qualquer desejo que não envolva a decisão de outra pessoa, exemplo, você não
pode desejar que uma noiva respondesse não ao noivo, pois isso é uma decisão
dela.
O gênio prosseguiu falando, mas parecia que
ouvia uma gravação com minha própria voz.
- O resto é valido,
desde poder voar á riquezas infinitas... - Talvez continuasse
falando se eu não o cortasse.
- Ok, ok. Chega de
conversa e realize logo meu desejo! - Meu sósia engole
algumas palavras.
- Já que você
insiste... – fala apontando o dedo para a lâmpada, do dedo sai um feixe de luz
azul atingindo ela, fazendo com quê ela encolhesse virando um pingente e a sua
corrente fosse para pendura-la em meu pescoço.
- Se você estiver com
ela no pescoço, e desejar, o desejo se tornará realidade.
Após dizer isso, o
gênio some em meio a fumaça azul.
Coloquei meu colar
mágico no pescoço, mas não me senti diferente. Resolvi fazer um teste.
- Eu desejo estar em
meu quarto, na minha casa.
De repente todo o
espaço em minha volta pareceu girar, mas eu não. E quando o local parou de
girar, eu não estava mais na casa abandonada, estava no meu quarto, com as
paredes cheias de pôsteres de filmes que gostava, com várias “tralhas” que eu havia
comprado ao longo dos anos e que me negava a jogar fora. Mas eu ignorei tudo
porque a lâmpada realmente funcionava!
Comecei com pequenos
pedidos, uma quantia de dinheiro, não muito, para meus pais não ficarem
desconfiados, aquele boné que eu tanto queria, assim eu passei a noite e o
outro dia no meu quarto fazendo esses desejos e usufruindo de meus pertences.
Pela manhã quando minha mãe perguntou se eu estava bem, falei que sim e disse
para não me perturbar, pois ainda estava chateado com ela, mas eu já não
lembrava mais por quê. Na hora do almoço ela voltou a chamar, falei que não
iria que tinha algumas guloseimas para comer.
No jantar daquele dia ela nem se
deu ao trabalho de ir falar comigo, o que achei bem melhor. Eu estava exausto
então apaguei, ali mesmo no chão.
Acordei no outro dia
com minha mãe me chamando, ela dizia que já eram duas da tarde e que iríamos
cantar os parabéns para meu irmão. Eu estava com vontade de ir ao banheiro,
então por força da natureza, tive que sair do quarto e participar da
comemoração.
Reunimos-nos na cozinha,
um modesto bolo em cima da mesa, de baunilha com cobertura de chocolate, o
preferido do meu irmão. Cantamos parabéns, mas eu nem fiz questão de ir
cumprimenta-lo. Então chega meu pai, um homem magro, cabelos castanhos e um
pouco mais alto que eu, e traz o presente dele, numa caixa toda enfeitada. Meu
irmão não consegue se segurar e rasga a embalagem revelando seu presente. Um
celular. Não apenas um celular... Era “o” celular. O que eu havia visto na loja
e minha mãe me negara, e meu irmão o ganhou. Eu não devia estar com inveja, eu
poderia ter um milhão daqueles se quisesse, mas eu estava. Nisso, uma ira
começou a brotar dentro de mim, eu estava cego de raiva, então interrompendo o
momento feliz do meu irmão, comecei a gritar:
- Como vocês dão a ele o presente que eu
pedi?! Principalmente você mãe! Foi pra você que eu pedi o celular!
Eles me olharam como se
eu fosse um louco, uma pessoa completamente insana, bem, analisando agora com
certeza eu era um louco, se irritar com algo tão fútil, ainda mais com a
lâmpada em meu poder.
- Filho, se acalme! Eu
não sabia que era esse que você queria!- disse minha mãe desesperada e com medo
da minha atitude, sempre fui uma pessoa de pavio curto.
- Não tem explicação!
Às vezes eu desejaria que todos vocês estivessem mortos!- sei que foi algo
pesado para se falar. Arrependi-me no mesmo momento em que fechei a boca. Mas
já era tarde demais...
A morte não é uma escolha.
Senti no meu pescoço uma sensação morna,
sensação que sempre ocorria quando um desejo iria se realizar. Chorei. Mesmo
antes de tudo acontecer, chorei. Minha família, agora confusa não entendeu
minhas lágrimas. Meu pai pareceu querer começar falar algo, mas não deu tempo.
Um caminhão do nada invadiu minha casa, batendo nos três que estavam juntos,
não havia motorista e nunca me preocupei em saber por que não. Não chamei por
socorro, sabia que estavam todos mortos. Apenas me ajoelhei ainda chorando.
E naquele momento, eu desejei morrer...